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Pesquisadores canadenses demonstraram durante o III Seminário Internacional de Justiça Restaurativa que o paradigma restaurativo tem sido eficaz na resolução de conflitos relacionados à infração de jovens e à violência contra a mulher em Quebec. O evento ocorreu durante toda essa quarta-feira (27/3), na sede do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), em Florianópolis.

Integrantes do Sistema de Justiça de Santa Catarina trocaram experiências e conheceram os resultados alcançados em Quebec com a utilização dessa modalidade autocompositiva, que é uma alternativa ao método punitivo utilizado pela justiça criminal, e busca reparar os danos causados não somente à vítima, mas também ao ofensor e à sociedade.

Segundo os pesquisadores, entre 2005 e 2010, aproximadamente 43 mil jovens de Quebec reconheceram sua responsabilidade ou se declararam culpados por pelo menos um crime. No entanto, 74% desses jovens receberam uma medida extrajudicial - ou seja, a maioria não passou pela punição proposta tradicionalmente pelo sistema de justiça criminal.

Além disso, o número de conflitos diminuiu a cada ano. Os dados, apresentados pela Professora Catherine Rossi, da Universidade de Laval, fazem parte de uma pesquisa sobre o Programa de Justiça Restaurativa na área da Infância e da Juventude, que já existe há mais de 30 anos em Quebec.

"Nós temos vários dados científicos que demonstram que a prisão não funciona nesses casos. Colocar um adolescente em uma prisão para que ele pense no que fez não faz sentido, porque os adolescentes sabem o que estão fazendo. O que precisamos é fazer os jovens entenderem a gravidade dos seus atos, por meio do diálogo mediado entre agressor e vítima, e, às vezes, com os pais dos agressores e das vítimas. O objetivo é educar e responsabilizar", explicou Catherine.

Além da conversa mediada, o programa também incentiva a reparação do dano para sociedade, com algum trabalho comunitário ou medidas educativas. A justiça penal só vem em casos de insucesso - que são poucos. "A pesquisa de resultados do programa demonstra que todos ficam felizes, tanto infratores como vítimas, porque ambos são respeitados no processo", afirma Catherine.

O pesquisador Serge Charbonneau, da Universidade de Montreal, explicou um pouco mais do funcionamento do sistema de Justiça Restaurativa de Quebec, além de destacar a simplicidade desse método em contraposição à complexidade da justiça comum. "Nós percebemos que, antes, os adolescentes não entendiam o que lhes era dito, e que nós também não entendíamos o que eles queriam dizer".

Justiça Restaurativa na Violência Doméstica

Cerca de 78% dos registros de violência doméstica em Quebec são de mulheres agredidas por homens e, apesar disso, há uma estimativa de que 70% das mulheres que são vítimas não denunciam. Em muitos casos, as mulheres buscam apenas que o agressor assuma a violência cometida, em uma solução íntima, sem a necessidade da judicialização. Muitas delas não querem a punição do agressor, mas sim recuperar a sua dignidade.

Nesse contexto, Marie-Claire Belleau, pesquisadora da Universidade de Laval, Catherine Rossi e Serge Charbonneau defenderam a utilização da justiça restaurativa como forma de ouvir as vítimas e dar a devida proteção aos envolvidos. Isso não significa dispensar a justiça tradicional, mas coexistir com ela, avaliando cada caso de forma isolada. Para os palestrantes, a mediação não busca a conciliação do casal e nem o compartilhamento da responsabilidade da agressão. Pelo contrário, ela pode trazer benefícios como reencontrar o empoderamento perdido pela vítima e auxiliar na solução de casos específicos, como a divisão de bens, pensão alimentícia para dependentes e o plano de ação parental depois da separação, além de eliminar o alto custo e a demora do processo na justiça tradicional.

Abertura

Durante a abertura, a Promotora de Justiça Iara Klock Campos, da comarca de Tubarão, destacou a importância de se discutir o tema. "A justiça restaurativa resgata o que tem de mais humano dentro de cada um de nós. As relações humanas são permeáveis de conflitos. Toda relação tem conflitos. E a justiça restaurativa ajuda a transformar esse conflito mostrando o que tem de mais humano dentro de cada um de nós", destacou.

Para o Juiz de Bom Retiro, Edison Alvanir Anjos de Oliveira Junior, "o evento busca construir espaços de diálogos para que reflexões e experiências possam ser compartilhadas possibilitando assim o ambiente propício de aprendizagem da justiça restaurativa. Objetivamos neste evento, além da troca de experiências, consolidar parcerias e fomentar uma política estadual sólida capaz de promover a disseminação e instalação administrativa da justiça restaurativa em todo o estado catarinense", afirmou.

Participaram da mesa de honra também o Coronel da Polícia Militar de Santa Catarina Marcello Martinez Hipólito e o professor do programa de pós-graduação em antropologia social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Theophilos Rifiotis.

O III Seminário Internacional de Justiça Restaurativa foi organizado pelo  Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), por meio do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude (CIJ), do Núcleo de Incentivo à Autocomposição e do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (CEAF) ,  em parceria com o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, por meio da Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude (CEIJ) e da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (CEVID),  bem como com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).





O que é Justiça Restaurativa?

A Justiça Restaurativa é uma técnica de solução de conflitos que tem como perspectiva a vítima, o infrator e a comunidade. Assista a entrevista da Promotora de Justiça Iara Klock Campos.

A Justiça Restaurativa e a violência doméstica

A Promotora de Justiça Iara Klock Campos fala sobre a aplicação da Justiça Restaurativa na comarca de Tubarão. 

A Justiça Restaurativa e a infância

O juiz de Bom Retiro Edison Alvanir Anjos de Oliveira Junior fala sobre a experiência com a Justiça Restaurativa.