Uma ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) foi julgada procedente, e os artigos do Código Estadual do Meio Ambiente que flexibilizam a proteção à araucária foram declarados inconstitucionais por unanimidade do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC).

A ação foi proposta pelo Centro de Apoio Operacional do Controle de Constitucionalidade (CECCON) do MPSC, que sustentou que o Projeto Conservacionista da Araucária (PCA), apesar do nome, permite a flexibilização das regras protetivas da Araucaria angustifolia, árvore símbolo do bioma Mata Atlântica, incluída na Lista Oficial de Espécies da Flora Brasileira Ameaçadas de Extinção.

Conforme o Ministério Público, em matéria ambiental, as normas suplementares editadas nos âmbitos estadual e municipal não podem ser menos protetivas ao meio ambiente do que as normas gerais editadas pela União. Dessa forma, a legislação suplementar não pode descaracterizar as normas gerais ditadas pela União, permitindo que haja maior intervenção de atividades e empreendimentos no meio ambiente.

No caso, a Lei Federal n. 11.428/2006, que dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do bioma Mata Atlântica e dos exemplares de vegetação, regulamentada pelo Decreto Federal n. 6.660/2008, disciplina que a supressão e a exploração eventual de vegetação pertencente a esse bioma são autorizadas pela legislação federal, ¿desde que a espécie não esteja incluída na Lista Oficial de Espécies da Flora Brasileira Ameaçadas de Extinção.

A Araucaria angustifolia está expressamente incluída no Anexo da Portaria n. 443, de 17 de dezembro de 2014, do Ministério do Meio Ambiente, e classificada como extinta na natureza. A mesma portaria ainda estabelece, em seu artigo 2º, a proteção de modo integral, "incluindo a proibição de coleta, corte, transporte, armazenamento, manejo, beneficiamento e comercialização" da espécie.

Os incisos II, III e IV do artigo 255-F do Código Estadual do Meio Ambiente, entretanto, ao estabelecerem a silvicultura, o estímulo à pesquisa para diversificação do emprego dos produtos e subprodutos originários da espécie e o manejo sustentável como atividades de interesse social para assegurar o cumprimento do projeto, acabam por permitir a supressão e utilização comercial da espécie ameaçada.

Neste sentido, a ação sustenta que merece especial atenção a terminologia "manejo florestal sustentável", que aparece não apenas no inciso IV do parágrafo único do artigo 255-F, mas em outras partes do texto normativo. Apesar do adjetivo "sustentável", o sentido apresentado pelo Código Estadual do Meio Ambiente ao termo revela o intuito comercial do "manejo", incabível para situações envolvendo a espécie ameaçada de extinção.

"Se o intuito do projeto é estabelecer medidas conservacionistas para a espécie ameaçada de extinção, não se revela adequado que as atividades de interesse social que norteiam a sua execução estejam relacionadas com o incentivo à derrubada e comercialização dos seus produtos e subprodutos, medida expressamente vedada pela norma geral federal mais protetiva que proíbe a exploração de espécies ameaçadas", acrescentou o CECCON.

Ressalta, ainda, que é contraditória a previsão no Código Estadual do Meio Ambiente de que a exploração comercial da madeira ameaçada, plantada ou não pelo ser humano, seja o cerne de um projeto que visa à reversão do processo de extinção da espécie, com especial ênfase na vedação da exploração das espécies ameaçadas, inclusive incentivando a criação de cooperativas dedicadas à exploração de comercial da espécie.

Argumentou, também, que "o Projeto Conservacionista da Araucária introduzido no Código Estadual do Meio Ambiente é claramente uma tentativa de ressuscitar o `Programa de Reflorestamento do Pinheiro Brasileiro", criado pela Lei Estadual n. 15.167/2010 e declarado inconstitucional pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina no bojo da ADI n. 2011.007178-0, justamente por incentivar a exploração comercial da espécie ameaçada.

Diante dos argumentos apresentados pelo MPSC, o Órgão Especial do TJSC votou, na sessão desta quarta-feira (4/10), de forma unânime pela procedência da ação, acompanhando o voto do Desembargador-Relator, considerando que, "conforme bem pontuado pelo Parquet em seu pleito exordial, se a intenção do legislador estadual é a de preservar a espécie, que o faça a par da Lei Federal posta, incentivando tão somente o reflorestamento e não a retirada do meio ambiente das árvores já existentes, especialmente quando possibilita eventual comercialização da espécie, com a aparente dispensa da exigência de parecer técnico do órgão ambiental".

(Ação n. 5019972-56.2022.8.24.0000)