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Ministros do TSE discutem Direito Eleitoral em Congresso Catarinense

Processo eleitoral, cota de gênero e inelegibilidades foram temas do evento sediado pelo Ministério Público de Santa Catarina.

19.11.2025 22:42
Publicado em : 
19/11/25 13:42

O último dia do Congresso Catarinense de Direito Eleitoral contou com a presença de Vera Lúcia Santana Araújo, ministra substituta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Joelson Costa Dias, ex-ministros do TSE, como painelistas. Com objetivo de ampliar o debate sobre Direito Eleitoral no contexto de reforma político-eleitoral, o evento é organizado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC), com parceria do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e da Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc).

Com realização presencial no auditório do MPSC e transmissão pelo canal do YouTube do TRE-SC, o Congresso abordou, ao longo de três dias, os seguintes temas: financiamento político, prestação de contas, enfrentamento à desinformação, inteligência artificial e propaganda eleitoral, processo eleitoral, inelegibilidade e cotas de gênero e grupos minorizados. 

Enquanto a ministra do TSE, Vera Lúcia, foi painelista sobre Cota de Gênero e Grupos Minorizados, ao lado do ex-ministro Joelson Costa Dias e da advogada Marilda de Paula Silveira. O ex-ministro do TSE, Tarcísio Vieira de Carvalho Neto compôs a mesa sobre Processo Eleitoral, ao lado de Luiz Fernando Casagrande Pereira, presidente da OAB/PR e Luiz Carlos Gonçalves, Procurador Regional da República.

 

“Agigantamento” da Justiça Eleitoral

Ao abordar o tema de Processo Eleitoral, o ex-ministro do TSE, Tarcísio Vieira de Carvalho Neto realizou algumas provocações sobre um movimento de “agigantamento” da Justiça Eleitoral, que, diferentemente das demais, já lida concomitadamente com aspectos jurisdicionais e administrativos. 

Nesse caminho, o painelista, primeiramente, conceituou o Direito Eleitoral como uma confluência de outros ramos do Campo e a Justiça Eleitoral como “uma agência reguladora de eleições”. Em sua fala, apresentou as lacunas na legislação como agravantes de um déficit de concretização teórica já existente no Direito Eleitoral, algo que tem reflexos no Processo Eleitoral. 

“Esse instituto do Processo Eleitoral, a partir de sua indefinição teórica mais responsável, tem permitido a expansão da própria competência da Justiça Eleitoral. Se falta consenso doutrinário e jurisprudencial sobre o conteúdo jurídico, nós podemos verificar, a partir dessa indefinição, prorrogações, extensões de competências indevidas”, conclui. 

O debate levantado pelo ex-ministro Tarcisio também encontrou diálogos entre os colegas painelistas da mesa de Processo Eleitoral e do Direito Eleitoral Sancionador, além de ter conexões tangentes com o debate sobre cota de gênero e grupos minorizados, no sentido de como lacunas na legislação podem abrir margem de interpretação em casos complexos, a exemplo do debate sobre a fraude à cota de gênero. 

 

 

“Perder significa ter condições de concorrer”

Ao responder um dos questionamentos da plateia do Congresso Catarinense de Direito Eleitoral referente a Súmula 73 do TSE sobre fraude a cota de gênero, durante a mesa Cota de Gênero e Grupos Minorizados, a advogada e professora Marilda de Paula Silveira, afirmou: “perder significa ter condições de concorrer”. 

Sua fala retoma a discussão realizada tanto por ela como pelos colegas ministros do TSE, Vera Lúcia Santana Araújo e Joelson Costa Dias sobre como a cota de gênero - que institui necessidade de no mínimo 30% de candidaturas femininas dentro dos partidos - está abrindo uma prerrogativa de “candidaturas laranja” para cumprir com a cota sem, de fato, existir a intenção daquela mulher concorrer. E ainda, como a Súmula 73 do TSE criou uma jurisprudência sobre fraude as cotas de gênero a partir de alguns critérios: votação zerada ou inexpressiva, prestação de contas zerada, ausência de movimentação e ausência de atos efetivos de campanha. 

À primeira vista, esses critérios poderiam dar conta de sancionar sobre fraude a cota de gênero, mas o que a advogada defende é que, por si, eles não traduzem, a realidade da mulher que historicamente se vê numa posição de desigualdade de oportunidades, se comparada aos homens brancos. 

Com isso, o que se tem são casos de mulheres julgadas por fraudar a cota de gênero e ser punida a partir dos mecanismos criados com intenção de diminuir essa disparidade: “Os estudos dizem que são 300 anos para que as mulheres ocupem espaços de poder de forma equiparada com os homens, no ritmo que está. Não me parece adequado, justo ou sustentável”, contextualiza. 

E é a partir da contextualização da advogada e professora Marilda de Paula Silveira que o ex-ministro do TSE, Joelson Costa Dias, aprofunda o debate sobre o risco do arcabouço normativo das ações afirmativas se tornar um ‘labirinto de Dédalo’, aprisionando as próprias pessoas que deveria proteger, especialmente as mulheres que enfrentam violência político partidária e abandono do partido. 

“Para evitar que candidaturas fossem instrumentalizadas, nós criamos esse labirinto interpretativo que agora está por aprisionar mulheres reais. Justamente aquelas que enfrentam a desistência tácita, a falta de apoio, a desigualdade material, a violência política e o abandono partidário. Nós estamos ‘apegados à Súmula’ e ela deveria ser uma síntese, não um substituto da análise concreta”, defende Joelson. 

 

“Com racismo não há democracia”

Já a ministra substituta do TSE, Vera Lúcia Santana Araújo, expressou como as falas dos colegas painelistas a coloca em um movimento pendular entre desespero e esperança. Para ela, é importante que essa discussão passe pelo conceito de representação, e não apenas de representatividade. 

“A representatividade pode viver do simbólico, e eu não quero viver do simbólico. Eu não quero ser a única pessoa a fazer uma autodescrição dizendo que é negra. Estando no lugar que estou. Ao mesmo tempo, eu não quero que as meninas negras pensem em mim como um modelo. Primeiro que sou só uma, segundo que é muito limitado. É, a rigor, estruturalmente, na organicidade de nossos poderes, nada. Não somente pela solitude, mas pelo pouco poder de transformação que esse espaço institucional nos confere”, contextualiza. 

É a partir da diferenciação de representatividade e representação que a ministra do TSE sintetiza os debates compartilhados pelos colegas. “Essa trajetória de muitas grandes vitórias não podem continuar atidas nessa representatividade. Eu, hoje, quero lutar por representação. Por partilha de poder. É disputa de poder, sim. E eu continuo com vigor para fazer essa disputa de poder, quer numa sessão no TSE, quer marchando na esplanada. [...] A nossa luta é na rua e nas instituições”, complementa. 

O movimento pendular com que a ministra do TSE, Vera Lucia Santana Araújo, abriu sua fala também teve espaço ao resgatar a luta da população negra. Às vésperas do 20 de novembro, dia da Consciência Negra, que marca, em 2025, os 330 anos da morte de Zumbi dos Palmares, a painelista reforça a importância da partilha do poder. 

“Com racismo não há democracia. Ou a gente se confronta, como sociedade, com uma proposta civilizatória que rompa com as barreiras impostas pelo racismo, que rompa com as barreiras permanentes do machismo e misoginia — que nos afasta dos poderes —, ou a gente vai ficar com essa sensação de que parece que nada aconteceu”, finaliza. 

Acesse o álbum de fotos do evento.

 

Fonte: 
Texto: Assessoria de comunicação do TRE/SC