MPSC atua em múltiplas frentes para enfrentar os desafios relativos à população em situação de rua
Com atuação integrada entre diversas Promotorias de Justiça, o MPSC busca assegurar direitos, ampliar a rede de proteção social e reforçar a segurança pública frente ao crescimento da população em situação de rua nos municípios catarinenses.
O fenômeno das pessoas em situação de rua é multifacetado, complexo e um desafio mundial que envolve saúde pública, assistência social, habitação e segurança pública. Sem uma abordagem que considere todas essas dimensões, não há solução possível. Por isso, o Ministério Público de Santa Catarina vem atuando de forma articulada por meio das Promotorias de Justiça de diferentes áreas em várias cidades do Estado, enquanto a Chefe da Instituição trabalha estrategicamente para integrar os órgãos públicos e garantir a implementação de políticas realmente efetivas.
Na capital, há uma série de apurações em curso. A garantia do direito de ir e vir, estabelecido na Constituição Federal, é uma delas. Recentemente, o chefe do Poder Executivo municipal divulgou vídeo em suas redes sociais mencionando a instalação de posto de controle migratório no Terminal Rodoviário Rita Maria. Aparentemente a intenção era proibir a entrada na cidade de pessoas em situação de rua.
A 30ª Promotoria de Justiça, com atuação na área da cidadania e direitos humanos, instaurou procedimento para apurar o que pode ser considerada lesão a direitos individuais constitucionais. O procedimento aguarda resposta do Município a uma série de questionamentos. Neste caso, o que se busca é esclarecer a legalidade da medida, assegurar o respeito ao direito de ir e vir e garantir que nenhuma política pública resulte em discriminação ou restrição indevida de direitos.
Já a 33ª Promotoria de Justiça, com atribuição na área da saúde pública, recomendou formalmente ao Prefeito de Florianópolis para que revogue o Decreto Municipal n. 28.550/25. A norma, também conhecida como Decreto das Marmitas, restringe a distribuição voluntária e gratuita de alimentos em espaços públicos da cidade. A iniciativa é considerada ilegal e inconstitucional por limitar a solidariedade e restringir direitos fundamentais e dificultar ações humanitárias voltadas à população em situação de rua.
O propósito da recomendação é assegurar que políticas públicas e normas municipais respeitem os princípios da solidariedade, da dignidade humana e da proteção social. Além disso, a 33ª Promotoria emitiu parecer favorável a um pedido judicial de anulação do decreto movido pelos padres Júlio Lancellotti e Pedro Baldissera, reforçando o entendimento de que a restrição à distribuição de alimentos constitui ilegalidade e inconstitucionalidade, por limitar o acesso a direitos essenciais da população vulnerável.
Identificação civil: proteção de direitos e fortalecimento da segurança pública
Em uma outra frente de atuação, a 14ª Promotoria de Justiça da Capital, com atuação na área dos registros públicos, tem trabalhado para garantir que a população em situação de rua consiga acessar seus documentos (segunda via de certidão de nascimento, por exemplo), o que é essencial para conseguir emprego e sair das ruas. A notícia de que cartórios restringiam o atendimento da população de rua e que cobravam emolumentos pelos serviços (que devem ser gratuitos para qualquer pessoa hipossuficiente), estão sendo rigorosamente apurados.
A identificação civil das pessoas em situação de rua também tem impactos diretos na segurança pública. A ausência de documentação pode facilitar que indivíduos condenados ou investigados — inclusive foragidos de outros estados — se aproveitem da invisibilidade das ruas para evitar a responsabilização por crimes já cometidos. Por isso, a identificação civil é fundamental não apenas para proteger os direitos e garantir o acesso a serviços essenciais da própria pessoa em situação de rua, mas também para permitir que o Estado organize políticas públicas eficazes e fortaleça a segurança da sociedade como um todo.
Já a 6ª Promotoria de Justiça, com atuação na área da execução penal, vem buscando fortalecer a atenção à saúde e à assistência social de pessoas privadas de liberdade, com o objetivo de garantir condições adequadas durante o cumprimento da pena e prevenir que, ao deixarem o sistema prisional, retornem à situação de rua. Essa medida é fundamental não apenas para proteger os direitos dessas pessoas, mas também para promover sua reintegração social, reduzir a reincidência criminal e contribuir para a segurança da comunidade.
A violência institucional é outra questão que preocupa o Ministério Público, que possui procedimentos em andamento para apurar possíveis abordagens com violência policial e com descarte de pertences pessoais de indivíduos em situação de rua por parte de agentes da Prefeitura de Florianópolis, da empresa terceirizada responsável pela coleta de lixo e das forças de segurança. A 40ª Promotoria de Justiça, com atuação na área do controle externo da atividade policial, tem orientado as polícias e guardas municipais sobre a forma de abordagem de pessoas em situação de rua.
A 11ª PJ de São José, na Grande Florianópolis, vem trabalhando para diminuir os riscos de procedimentos desnecessários ou truculentos nas abordagens realizadas por Fiscais de Áreas Verdes da Secretaria de Urbanismo e Serviços Públicos (SUSP). O ideal é que as abordagens da população de rua sejam realizadas pela Assistência Social e Saúde.
Em nota institucional, a Procuradora-Geral de Justiça, Vanessa Wendhausen Cavallazzi, já frisou que o MPSC defende que as abordagens às pessoas em situação de rua sejam feitas com respeito à dignidade humana. Só quando necessário e por questões de segurança, podem ser acompanhadas por agentes de segurança pública armados, exclusivamente dentro das técnicas policiais recomendadas internacionalmente.
Segurança Pública
Também a garantia da segurança pública é alvo de inciativas do MPSC. No limite entre Florianópolis e São José, a 30ª Promotoria de Justiça da Capital e a 11ª Promotoria de São José inovaram para conter os impactos à cidadania gerados pelo furto de fios, usualmente atribuída a usuários de drogas que também vivem nas ruas. A força-tarefa Cuidados Urbanos, que hoje está em atuação, tem como foco área tomada pelo uso de drogas no viaduto entre os municípios de Florianópolis e São José, na Via Expressa.
Os trabalhos da força-tarefa – executados na perspectiva da segurança pública, da saúde pública, da ordem sanitária e da assistência social - envolvem, junto com o Ministério Público, as duas prefeituras, Florianópolis e São José, forças de Segurança Pública, Assistência Social, DENIT, Conselho de Segurança, sociedade civil. Em dois meses, foi ampliada a abordagem da assistência social na região. Em paralelo, o combate à receptação de fios roubados foi intensificado pelas forças de segurança pública.
GT do MPSC articula ações em direitos humanos, saúde e segurança
O crescimento da população em situação de rua não é um fenômeno restrito a Florianópolis e exige uma abordagem multidisciplinar. Diante disso, um grupo composto por 12 Promotores e Promotoras de Justiça com atribuições na área de direitos humanos, saúde pública e segurança pública está atuando em conjunto para fomentar a interlocução com a sociedade civil organizada e os poderes constituídos a fim de que todas as faces da questão sejam contempladas. O Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos e Terceiro Setor (CDH) do MPSC atua como articulador das atividades do grupo.
O grupo de trabalho tem mantido reunião permanente para discussão dos temas mais importantes, tais como moradia, abordagens, alimentação e restrição de deslocamento em território nacional. Recentemente, foi realizada reunião com todas as equipes de assistência social dos 23 municípios da Grande Florianópolis. A reunião contou com membros do MPSC, FECAM, Granfpolis e representantes das Secretarias Municipais de Assistência Social de todos os municípios da Grande Florianópolis.
O encontro teve como foco discutir a problemática da população em situação de rua, compartilhar experiências locais, identificar dificuldades e propor estratégias de atuação conjunta entre os órgãos públicos e entidades envolvidas. Os participantes reforçaram que os desafios são comuns entre os municípios e que a atuação integrada é essencial. O Ministério Público foi apontado como agente político capaz de promover interlocução e apoiar a implementação de políticas públicas mais eficazes para a população em situação de rua.
Diagnóstico integrado e iniciativas replicáveis do MPSC
O grupo de trabalho também está promovendo a análise do diagnóstico sobre o perfil das pessoas em situação de rua em Santa Catarina. Foram elencados pontos importantes para o debate com todos os órgãos e entidades envolvidas com o tema. Também mapeia iniciativas que os Promotores de Justiça estão desenvolvendo em diferentes regiões do estado, formando um banco de boas práticas que podem ser adaptadas e seguidas pelos demais membros o MPSC.
Veja algumas delas, além das já citadas em Florianópolis:
- a 5ª PJ de Joinville instaurou procedimento para apurar a falta de CAPS AD III, justamente a unidade de saúde responsável pelos tratamentos de álcool e drogas;
- a 8ª PJ de Joinville instaurou Inquérito Civil para apurar como são feitas as abordagens pelas forças de segurança às pessoas em situação de rua;
- a 4ª PJ de Tubarão está investigando a necessidade de mais serviços para pessoas em situação de rua;
- a 11ª PJ de São José está apurando a necessidade de Apec (Serviço de Atendimento à Pessoa Custodiada), um serviço que pode auxiliar muitas pessoas em situação de rua que se envolvem com pequenos delitos. A pessoa é atendida dentro do próprio fórum. O mesmo ocorre na 10ª PJ de Tubarão;
- a 2ª PJ de Joaçaba está buscando fortalecer a atenção à saúde e assistência social de pessoas presas, para evitar que, na saída da prisão, caiam nas ruas ou voltem para a rua;
- a 13ª PJ de Itajaí conseguiu liminar para obrigar o Município a instalar um Centro Pop, ou seja, centro de atendimento à população (inclusive de rua).
O grupo também está monitorando iniciativas positivas do Poder Público, e detectou, por exemplo, avanços importantes nas unidades de acolhimento de Chapecó e Florianópolis. Chapecó tem trabalhado integradamente com as famílias desde a primeira abordagem da pessoa em situação de rua, o que faz com que os laços familiares logo sejam retomados. Além disso, paga bolsa de estudos para os acolhidos na Unidade de Acolhimento, o que ajuda a mantê-los no serviço e conquistarem a autonomia. São oferecidos cursos profissionalizantes de grande aceitação no mercado, como por exemplo assentador de pisos cerâmicos de grandes tamanhos, logo absorvidos pela indústria da construção civil.
Em Florianópolis, além de uma significativa melhoria da unidade de acolhimento, há passos significativos, tal como a aproximação, no mesmo ambiente, de uma enfermaria para tratamento da saúde e dos espaços para acolhimento e pernoite. São servidas 1.200 refeições diárias. “Também há bons resultados na aproximação de empresas tomadoras de mão de obra da Unidade de Acolhimento, propiciando emprego para quem está acolhido, que pode então usufruir de acomodações mais privativas dentro da unidade e assim conquistar rapidamente a autonomia”, completa o Coordenador do CDH, Promotor de Justiça Eduardo Sens dos Santos.
Sens dos Santos, destaca, ainda, o trabalho do Ministério Público em relação à saúde mental, com marcantes reflexos na população de rua. Uma preocupação é com as comunidades terapêuticas, que são usadas com frequência a pretexto de tratamento contra drogas, mas na prática são desestruturadas e apresentam problemas sérios. “Estamos fiscalizando as comunidades terapêuticas para impedir que piorem o estado de quem busca tratamento. Só neste semestre foram presos oito administradores de comunidades terapêuticas que mantinham os acolhidos em cárcere privado, um crime bastante grave”, salientou.
Outro exemplo, também em relação à saúde mental, é a formação de uma força-tarefa específica para a implantação do Serviço Residencial Terapêutico. É um serviço de acolhimento de pessoas que passaram muito tempo internadas. “Serve para restituí-las gradualmente à sociedade. Sem esse serviço (e Santa Catarina tem pouquíssimos), a pessoa também acaba na rua. Logo, evita o aumento da população de rua”, completou Sens dos Santos.
Chefe do MPSC e articulação interinstitucional
A Procuradora-Geral de Justiça do MPSC, Vanessa Wendhausen Cavalazzi, tem articulado iniciativas estratégicas junto ao Governo do Estado e demais instituições estaduais e municipais para construir políticas públicas efetivas em áreas como assistência social, saúde e segurança envolvendo os moradores em situação de rua.
Vanessa esteve presente recentemente em uma reunião realizada pelo Governador Jorginho Mello com chefes de Poderes e representantes de diversas instituições estaduais e municipais. O encontro faz parte da força-tarefa coordenada pelo Governo do Estado para padronizar a abordagem e qualificar o atendimento às pessoas em situação de rua em todo o território catarinense.
Durante a reunião, o Governador anunciou a publicação, nos próximos dias, do decreto que regulamenta a Lei n. 19.380, que institui o Cadastro Estadual de Pessoas em Situação de Rua. A medida busca unificar informações e estabelecer um padrão de identificação e atendimento para todos os municípios. Vanessa Cavalazzi reforçou a importância da integração entre órgãos públicos e da atuação conjunta para garantir políticas efetivas, destacando o papel do Ministério Público na fiscalização e no acompanhamento das ações
Outro ponto debatido foi a implantação do aplicativo do programa Muito Além das Ruas, que funcionará como um prontuário eletrônico, reunindo dados e histórico de atendimentos. A ferramenta permitirá maior integração entre os serviços de saúde, assistenciais e as forças de segurança, fortalecendo as políticas públicas. Com a constante migração da população de rua, os serviços prestados por um município acabavam se perdendo na mudança de domicílio. Daí o papel fundamental do Estado em realizar investimentos voltados à mitigação do problema. Uma nova reunião está prevista para dezembro, quando serão avaliados os avanços e próximos passos da iniciativa.
Saiba mais :
https://www.mpsc.mp.br/w/noticias/mpsc-e-prefeitura-de-florianopolis-farao-parceria-para-compartilhamento-de-dados-sobre-populacao-em-situacao-de-rua-
Últimas notícias
01/12/2025MP recupera mais de R$ 134 mil para o Município de Palhoça e o Estado de Santa Catarina com acordos na área da moralidade administrativa
01/12/2025MPSC lança nova edição do “MPSC em Ação” com foco no Prioriza, programa que aproxima a atuação do Ministério Público da realidade catarinense
01/12/2025MPSC atua em múltiplas frentes para enfrentar os desafios relativos à população em situação de rua
01/12/2025Aviso de pauta: MPSC sediará seminário nacional sobre autocomposição
01/12/2025MPSC e instituições parceiras promoverão evento com palestras e ações educativas no Dia Internacional de Combate à Corrupção
Mais lidas
10/10/2025GAECO deflagra Operação “Hora do Show” que investiga irregularidades e direcionamento em processos de contratação pública no Oeste
15/10/2025GAECO, em apoio à 39ª Promotoria de Justiça da Capital, deflagra operação para combater organização financeira de facção criminosa
08/10/2025GAECO e Polícia Civil deflagram a operação “Carta branca” para apurar crimes contra a administração pública na região do Planalto Serrano
26/11/2025GAECO/MPSC deflagra operação “Carga Oca” para investigar fraudes em fornecimento de material tipo macadame à SEURB entre 2022 e 2024
09/10/2025Mulher que matou companheiro em reserva indígena é condenada
31/10/2025GAECO deflagra Operação Nuremberg para desarticular um dos maiores grupos neonazistas em atividade no Brasil