Se no País a falta de profissionais de saúde é uma das principais
dificuldades da área, em Santa Catarina a deficiência de pessoal decorre do não
cumprimento integral da carga horária dos médicos e dentistas da rede pública.
Esta é a principal conclusão do Inquérito Civil Público instaurado em 2004 pelo
Ministério Público de Santa Catarina para verificar o cumprimento da jornada de
trabalho destes profissionais.
Se no País a falta de profissionais de saúde é uma das principais
dificuldades da área, em Santa Catarina a deficiência de pessoal para o
atendimento à população decorre do não cumprimento integral da carga horária dos
médicos e dentistas da rede pública. Esta é a principal conclusão do Inquérito
Civil Público instaurado em 2004 pelo Ministério Público de Santa Catarina
(MPSC) para verificar o cumprimento da jornada de trabalho estabelecida em
concurso ou por contrato para os profissionais da rede pública. O MPSC confirmou
que Santa Catarina não tem controle da carga horária e que há indícios de
irregularidades na maior parte dos Municípios. A apuração teve início após
denúncias feitas pela imprensa, dando conta de problemas nos Municípios da
região do Médio Vale do Itajaí, e acabou estendida para todo o Estado.
Foram levantadas informações a respeito dos 4.968 médicos e 1.895 dentistas integrantes ou cedidos à rede municipal e à rede estadual de saúde. Os dados foram requisitados pelos 110 Promotores de Justiça que atuam na área, e o trabalho conduzido pelo Coordenador do Inquérito Civil, Promotor de Justiça João Carlos Teixeira Joaquim, em conjunto com o Coordenador-Geral do Centro de Apoio Operacional da Cidadania e Fundações do MPSC (CCF), Procurador de Justiça Aurino Alves de Souza, com o Coordenador do CCF, Promotor de Justiça Davi do Espírito Santo, e com a Promotora de Justiça da Capital Sonia Maria Demeda Groisman Piardi.
Em relação à rede municipal, o Ministério Público apurou que 95,22%, ou 279 dos 293 Municípios, apresentam variados indícios de irregularidade no cumprimento da carga horária dos profissionais, e que 73,72%, ou 216 Municípios, não utilizam cartão-ponto como medida para controlar a sua freqüência. "A ausência dos médicos e dentistas gera uma demanda reprimida da população pelo atendimento médico. Somente com o cumprimento do horário de trabalho é que poderíamos saber se o número de profissionais existentes é suficiente para a demanda no Estado. Atualmente o não cumprimento da jornada é o principal motivo da falta de profissionais, da demora no atendimento à sociedade ou mesmo do não atendimento", afirma João Carlos Joaquim.
Na rede estadual foi constatada outra grave situação: os médicos e dentistas têm carga horária semanal de 40 horas, mas desde 1993 cumprem apenas 30 horas semanais. A redução na jornada foi acordo celebrado em greve por melhoria salarial e instituído por ato administrativo, sem qualquer amparo legal, e ainda permite que os profissionais recebam pagamento por hora-extra quando excedem 30 horas por semana. Além disso, a Secretaria Estadual de Saúde não conseguiu comprovar ao Ministério Público a existência de controle da freqüência dos seus médicos e odontólogos. "O não cumprimento da carga horária leva a rede pública à necessidade de novas contratações, impedindo a otimização dos recursos públicos na área de saúde e a melhoria nos vencimentos dos profissionais em atividade", aponta o Coordenador do Inquérito Civil.
Entre os indícios de irregularidades apurados pelo MPSC estão o preenchimento de livros-ponto com horas cheias e idênticas todos os dias; documentos atestando o cumprimento de mais de 60 horas semanais por médicos e dentistas, em vários casos até 100 horas por semana; e a existência de profissionais com mais de dois empregos na rede pública, quando a Constituição Federal limita em dois vínculos. "Se o profissional tem mais de dois vínculos apenas na rede pública, é um indício de que não conseguirá cumprir toda a jornada. E é muito difícil atuar por mais de 60 horas semanais no setor público, considerando que a maior parte da rede não funciona nos finais de semana", aponta João Carlos Joaquim.
Além de requisitar informações às Prefeituras Municipais e ao Estado, o Ministério Público também ouviu pelo menos um servidor da área de saúde em cada Município. A maioria, ou 61,09% deles, confirmou que as informações constantes em livros-ponto não representam a realidade. Para o Promotor de Justiça, se o Ministério Público pudesse cruzar as informações coletadas com dados da rede privada de saúde, seria possível comprovar que alguns profissionais deixam de cumprir expediente no setor público para atender em estabelecimentos particulares.
Programa de Saúde Familiar
A apuração também possibilitou ao Ministério Público verificar que 22,53% dos Municípios terceirizam o Programa de Saúde Familiar (PSF). Nestes casos, ocorre uma grande alternância dos profissionais que prestam o atendimento, desvirtuando a finalidade do PSF que é gerar vínculo entre o médico e os pacientes ou família atendidos. O MPSC vai conceder prazo aos Municípios nesta situação para que rescindam os contratos com prestadores de serviço e providenciem a contratação dos profissionais do PSF segundo as normas do Ministério da Saúde e os princípios da administração pública.
MPSC vai exigir medidas para a
regularização
Com o levantamento concluído, os Promotores de Justiça de todas as Comarcas darão continuidade ao Inquérito Civil, com prazo de 90 dias para exigir medidas do poder público que resultem no cumprimento da carga horária dos médicos e dentistas. A diretriz para o trabalho é a busca de soluções consensuais e por meio de Termos de Ajustamento de Conduta (acordos extrajudiciais) com as Prefeituras e Estado. Em último caso, os Promotores de Justiça poderão ajuizar ações civis públicas exigindo a implementação de ações para a regularização da freqüência dos profissionais.
O Ministério Público vai exigir a implantação de ponto mecânico ou eletrônico em todas as unidades de saúde da rede pública de Santa Catarina, instrumento considerado pela sua Auditoria como o mais eficaz para o controle de freqüência. Com base em recomendação do Conselho Nacional de Saúde, as unidades também deverão apresentar à população quadro com o nome, turno e horário de trabalho de cada médico e dentista, além de um número de telefone para reclamações do público caso o profissional não esteja cumprindo a escala de serviço, de forma a permitir o controle social da freqüência.
O Inquérito Civil apurou que 70,99%, ou 208 Municípios,
não possuem legislação que regulamente o controle da freqüência diária de
médicos e dentistas. Por isso, o Ministério Público também vai oferecer prazo
para que estes encaminhem projeto de lei dispondo sobre o assunto. Os Prefeitos
Municipais também deverão designar servidor para fiscalizar o cumprimento do
horário dos médicos e odontólogos, e descontar mensalmente de seus vencimentos
os valores correspondentes às horas não registradas, sob pena de estarem sendo
coniventes com uma situação irregular, com prejuízo aos serviços de saúde
pública e ao erário.
Dados colhidos pelo MPSC no Inquérito
Civil Público
216 Municípios (73,72%) não usam o cartão-ponto
para controlar a freqüência de médicos e dentistas.
Alguns destes usam ficha ou livro-ponto, mas a Auditoria do MPSC considerou
estes instrumentos ineficazes pela possibilidade de fraude nos registros.
70 Municípios (23,89%) não possuem qualquer tipo de
controle da freqüência.
Apenas 54 Municípios (18,43%) fazem o controle da freqüência
de forma adequada, por meio de cartão-ponto.
279 Municípios (95,22%) apresentaram algum indício
de irregularidade na freqüência de médicos e dentistas.
208 Municípios (70,99%) não possuem legislação
específica dispondo sobre forma de controle e fiscalização
da carga horária médica, o que facilita a ausência
de controle.
61,09% dos servidores da área de saúde ouvidos pelo
MPSC declararam existir irregularidades na freqüência de
médicos e dentistas de seu Município.
Em 15,36% dos Municípios os médicos e dentistas cumprem
seu contrato de trabalho a partir de cotas de atendimento. Atendem
a um determinado número de pacientes por período e depois
se ausentam da unidade de saúde, mesmo que a carga horária
não tenha sido cumprida.
66 Municípios (22,53%) terceirizam o Programa de Saúde
Familiar (PSF), propiciando que seja desvirtuado de sua finalidade.
Medidas que serão exigidas pelo Ministério
Público
Implantação de ponto mecânico ou eletrônico
de preenchimento diário em todas as unidades de saúde
da rede pública para todos os médicos e dentistas.
Publicação em mural de quadro com nomes, turnos e
horários de trabalho dos médicos e dentistas em todas
as unidades de saúde, incluindo um número de telefone
para reclamações da população.
As Prefeituras que não dispõem de legislação
regulamentando formas de controle da freqüência de médicos
e dentistas deverão encaminhar projeto de lei sobre o assunto.
Desconto na folha do pagamento do profissional que não cumprir
a carga horária contratada sem justificativa legal.
As Prefeituras deverão designar servidor para fiscalizar
o cumprimento do horário dos médicos e odontólogos.
O Município que não estiver cumprindo as diretrizes
do Programa de Saúde Familiar (PSF) deverá rescindir
o contrato com prestadores de serviço e providenciar a contratação
dos profissionais seguindo os princípios do Ministério
da Saúde e da administração pública.
Sem controle, maioria dos médicos e dentistas de SC não cumpre carga horária na rede pública de saúde
Se no País a falta de profissionais de saúde é uma das principais
dificuldades da área, em Santa Catarina a deficiência de pessoal decorre do não
cumprimento integral da carga horária dos médicos e dentistas da rede pública.
Esta é a principal conclusão do Inquérito Civil Público instaurado em 2004 pelo
Ministério Público de Santa Catarina para verificar o cumprimento da jornada de
trabalho destes profissionais.