Detalhe
O Corregedor-Geral do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, objetivando conscientizar os Promotores de Justiça sobre as novas e graves responsabilidades que a nova Constituição Federal, promulgada a 05 de outubro de 1988, lhes comete, resolve prover :
1. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA JULGAR PREFEITOS
1.1. Entre as novidades elevadas na atual Carta Magna merece destaque o foro privilegiado a que têm direito os Prefeitos Municipais, quando julgados por crime de responsabilidade ou mesmo comum. A novidade foi introduzida em nosso direito pelo artigo 29, VIII, da CF, no Título III, Capítulo IV.
1.2. Referido artigo (29, VII, CF) atribui competência ao Tribunal de Justiça para julgar Prefeitos, referindo-se, é evidente, a crimes de responsabilidade (Decreto-lei nº 201/67) e comuns.
1.3. O art. 70, das Disposições Constitucionais Transitórias, todavia, estabelece que a competência dos tribunais estaduais persiste até que a mesma seja definida na Constituição do Estado, nos termos do art. 125, § 1º, da Constituição". Este dispositivo, por sua vez, refere que "a competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado", do que se deduz, pois, não se mostrar auto-aplicável a norma do art.29, VIII, da atual Carta Federal. É que, aqui e especialmente, se mostra a continuidade das competências dos Tribunais de Justiça nos moldes da Constituição de 1967, sem as inovações, portanto, consignadas no texto da de 05 de outubro de 1988, só passíveis de validade, destarte, após a vigência dos novos diplomas constitucionais dos estados membros, até agora não elaborados, sequer. Por isso, então, descabe imediata atenção ao teor do disposto no art.29, VIII, da Constituição de 1988, dês que os Prefeitos não possuem, como ali consignado, ainda o foro privilegiado para os seus julgamentos.
2. DA BUSCA E APREENSÃO DOMICILIARES
2.1. Por definição constitucional, a casa é o asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo entrar sem o consentimento do morador, salvo:
a) em caso de flagrante delito;
b) de desastre;
c) de prestação de socorro; casos em que não se há de observar horário. Ainda, d) por determinação judicial fundamentada, durante o dia (artigo 52, inciso XI, CF).
2.2. Na hipótese do artigo 6º, inciso II, do CPP, a autoridade policial continua sendo competente para determinar a apreensão dos instrumentos e todos os objetos que tiverem relação com o fato delituoso: mas, o ingresso em qualquer casa dependerá de determinação judicial, expressa por mandado, consoante as disposições do art. 5º, inciso XI, CF, com prazo de eficácia. Destarte, está revogado o artigo 241 do Código de Processo Penal.
2.3. À autoridade policial, porém, é imposto o dever de requerer, ao Juízo competente, mandado para proceder busca, apreensão, revista e outras medidas da mesma relevância, inclusive as que exigem arrombamento, no interior da casa.
2.4. Saliento, apenas para o conhecimento dos Promotores, que os pedidos deverão ser protocolados e decididos desde logo pelo magistrado, podendo o despacho ser exarado no próprio requerimento; tudo sem a intervenção do Ministério Público.
3. DA PRISÃO
3.1. O artigo 5º, inciso XV, CF, garante o direito à liberdade de locomoção, fazendo da prisão um limite extremo a esse princípio.
3.2. A prisão só poderá ocorrer, pois, nas hipóteses abaixo: a) em flagrante delito; b)por decisão judicial compreendida esta como a ordem escrita e fundamentada, emanada autoridade judiciária competente (art. 5º, inciso LXI, CF).
3.3. Sempre que ocorra a prisão de qualquer pessoa, em flagrante delito, é dever da autoridade, identificada nos artigos 304, 307 e 308 do CPP:
3.3.1. Comunicar imediatamente ao juiz competente, à família do preso ou à pessoa por ele indicada, informando lhes, ainda, o local onde se encontre(art. 5º, inciso LXII,CF);
3.3.2. Esclarecer ao preso quais os seus direitos, entre eles o de ficar calado, se quiser, comunicando-lhe também quem o prendeu (art.5º, incisos LXIII e LXIV, CF);
3.3.3. Assegurar ao preso a assistência de advogado e da sua família (art.5º, inciso LXIII, CF);
3.3.4. Lavrar incontinente o auto de prisão em flagrante; e
3.3.5. Conceder, no âmbito de sua competência e de conformidade com a lei, fiança, após a lavratura do flagrante, em sendo afiançáveis o delito. Paga a fiança, liberará o detido (art. 5º, inciso LXVI, CF) imediatamente. Se o preso se livrar solto, será posto em liberdade, depois de lavrado o auto de prisão em flagrante (arts.304, § 1º, 309 e 321 do CPP).
3.4. Ao receber a comunicação a que se refere o item 3.3.1., o Juiz procederá ao controle da legalidade da prisão, relaxando-a, se for o caso (art. 5º, inciso LXV, CF).
3.5. Recebido o auto de prisão em flagrante, ausente qualquer das garantias procedimentais, a autoridade judicial deixará de homologá-lo, relaxando a prisão. Idêntica será a decisão em todas as demais hipóteses e situações de não cabimento da prisão em flagrante.
3.6. Não havendo razão para deixar de homologar o auto de prisão em flagrante, o juiz o homologará, concederá ou não, liberdade provisória (art.310 e parágrafo único do CPP) ou fiança, inclusive sobrestando o pagamento, se for impossível ao réu prestá-la, por motivo de pobreza; ou se o preso livrar-se solto, mandará pô-lo em liberdade.
3.7. Sempre que comunicada, pelo juiz, do relaxamento da prisão, antes da lavratura do flagrante, a autoridade responsável pela prisão liberará, desde logo, o preso, deixando de realizar o auto de prisão em flagrante.
3.8. A prisão decorrente de decisão judicial deverá ser efetuada por mandado devidamente fundamentado, na lei material e processual, que são as determinantes da constrição.
3.9. Do mesmo mandado deverá constar informação ao preso de que é seu direito a indicação de familiar ou outra pessoa, a quem o Juízo comunicará sua prisão e local onde se encontrar recolhido, desde que não tenha defensor constituído.
3.10. A autoridade policial, sempre que realizar o cumprimento do mandado judicial (art.13, inciso III, CPP), comunicará a efetivação da prisão e o local do recolhimento, imediatamente, ao Juízo.
4. DA NÃO-LAVRATURA DO AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE .
4.1. Quando a autoridade policial entender que, em lhe sendo conduzido preso, não deva lavrar auto de flagrante, deverá comunicar de pronto, tal circunstância ao juiz destinatário do flagrante, caso tivesse sido ele lavrado.
5. ATIVIDADE POLÍTICO-PARTIDÁRIA
5.1. O artigo 128, § 5º, inciso II, letra "e" da Constituição Federal elegeu como regra a proibição da atividade político-partidária do membro do Ministério Público, ressalvando as exceções previstas em lei.
5.2. Como não está regulamentado este artigo, por enquanto, a legislação atual (LC nº 40/81) não diz quais as hipóteses vedadas. Dirá, com certeza, quando da regulamentação do dispositivo as permitidas, já que as vedações constituem exceção.
6. IDENTIFICAÇÃO DO INDICIAMENTO
6.1. "O civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em Lei " (art.5º, LVIII, CF).
6.2. O dispositivo merece a seguinte interpretação:
a) a CF quer impedir o "bis in idem" na identificação civil e criminal;
b) o indiciado tem de provar, no ato, estar identificado civilmente; se não o fizer, está sujeito a identificação criminal, inclusive datiloscópica;
c) em caso de suspeita sobre a identidade, pode-se criar um auto de constatação de identidade, dentro do qual colhem-se os dados, inclusive datiloscópicos, ainda que somente do polegar direito, para posterior comparação.
7. DA AÇÃO PRIVADA SUBSIDIÁRIA
7.1. O artigo 29 do CPP alinha as hipóteses de cabimento da ação privada subsidiária.
7.2. A nova Carta Constitucional (art.52, LIX), tratando da ação privada subsidiária, repete as hipóteses já alinhadas no dispositivo suso mencionado (art.29 do CPP).
7.3. Em caso de o Promotor pedir o arquivamento de inquérito, descabe ação privada subsidiária, entendimento aliás, de há muito cristalizado na jurisprudência.
8. REPRESENTAÇÃO DA UNIÃO
8.1. O artigo 129, inciso IX, da Constituição Federal de 1988, veda ao Ministério Público a representação judicial e a consultaria de entidades públicas;
8.2. a regra é de aplicação imediata;
8.3. contudo, por delegação expressa da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, o Ministério Público estadual poderá representar judicialmente a União nas demandas de natureza fiscal, exclusivamente, até a promulgação das leis complementares referidas no artigo 29,das Disposições Transitórias (parágrafo 5º deste artigo).
8.4. Saliento que não caberá delegação em outras hipóteses, além das ações de natureza fiscal; acrescendo dizer que, sem a referenciada delegação expressa, os membros do Ministério Público local não tem atribuição para oficiar em ações fiscais.
9. CUSTAS NOS PROCESSOS DE HABILITAÇÃO DE CASAMENTO
9.1. O art. 128, § 5º, II, letra a, da Constituição Federal, veda ao representante do Ministério Público, a percepção de custas processuais. Não distingue o dispositivo se estas custas são judiciais ou extra-judiciais, de sorte que a proibição é de ordem genérica, descabendo, portanto e no caso, perquirir-se de que tipo ela se trata. Não mais podem, conseqüentemente, os Promotores de Justiça perceber custas nos processos de habilitação de casamento. Quanto a destinação de tais verbas, à Associação Catarinense do Ministério Público cabe orientar os colegas de como proceder ao seu recolhimento.
10. DIVÓRCIO
10.1. O art. 226, § 6º, da CF, modificou as condições de dissolução do casamento civil, através do divórcio sendo as seguintes as alterações surgidas na espécie:
10.1.1. Não se tem, ainda, uma definição a respeito de limitações ao número de divórcios para pessoas já divorciadas. Alguns autores admitem - talvez apressadamente - a inexistência de restrições quanto à possibilidade de uso deste direito por mais de uma vez, enquanto que outros referem a necessidade de regulamentação do instituto, através de lei ordinária. Estes, entretanto, dizem que, até lá, deve prevalecer o princípio insculpido no art. 38, da Lei n. 6.515/77.
10.1.2. A prévia separação judicial - nos casos já expressos em lei - deve existir por mais de um ano para possibilitar a sua conversão em divórcio; e
10.1.3. O divórcio também pode ser requerido, diretamente, comprovando-se a separação de fato por mais de dois anos.
Florianópolis, 4 de janeiro de 1989.
Cyro Campos
Corregedor-Geral do Ministério Público