12.07.2005

Deputado federal e três ex-prefeitos são condenados em Pomerode

O Deputado Federal João Alberto Pizzolatti Júnior e três ex-prefeitos de Pomerode, Henrique Drews Filho, Reimund Viebrantz e Magrit Krueger, foram condenados em ação civil pública movida pelo Ministério Público de Santa Catarina por fraude na contratação, de 1997 a 2001, pela Prefeitura daquele Município, da empresa Urbe Engenharia e Consultoria Ltda.

O Deputado Federal João Alberto Pizzolatti Júnior e três ex-prefeitos de Pomerode, Henrique Drews Filho, Reimund Viebrantz e Magrit Krueger, foram condenados em ação civil pública movida pelo Ministério Público de Santa Catarina por fraude na contratação, de 1997 a 2001, pela Prefeitura daquele Município, da empresa Urbe Engenharia e Consultoria Ltda, anteriormente denominada Pizzolatti Engenharia e Consultoria Ltda., de propriedade do parlamentar e de seu irmão, o engenheiro Ariel Arno Pizzolatti, atual Chefe do 11º Distrito (SC) do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

Em graus variados, todos foram condenados civilmente à suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, ressarcimento integral e solidário do dano equivalente aos valores pagos à empresa, pagamento de multas civis e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios - veja abaixo trecho final da sentença de 40 páginas.

A empresa Urbe foi condenada ao ressarcimento integral e solidário do dano equivalente à totalidade dos valores que foram pagos pelo Município a seus proprietários, acrescidos de juros e correção monetária a partir dos pagamentos efetuados, além de multa civil em duas vezes o valor recebido, corrigido monetariamente, e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, pelo prazo de cinco anos.

Foram pagos à empresa Pizzolatti/Urbe mais de R$ 220 mil, de agosto de 1997 até junho de 2001. Mas antes mesmo da realização da licitação a empresa já havia recebido da Prefeitura, no dia 22 de julho de 1997, o valor de R$ 1.920,00. A ação do MPSC foi aforada pelo Promotor de Justiça Odair Tramontin e a sentença proferida pela Juíza de Direito Iraci Satomi Kuraoka Schiocchet. Da decisão cabe apelação ao Tribunal de Justiça.

De acordo com Tramontin, em 1997 o Município de Pomerode, comandado à época por Drews Filho, realizou licitação, depois renovada anualmente por mais cinco vezes pelos seus dois sucessores, Reimund Viebrantz e Magrit Krueger, para contratar "serviços de assessoria e consultoria técnica na elaboração e acompanhamento de projetos nas áreas de financiamento e desenvolvimento urbano", quando a Prefeitura dispunha de funcionários com capacitação técnica em seu quadro de pessoal.

O vício também ficou caracterizado desde a primeira licitação no fato de terem concorrido outras duas empresas de sócios em comum. Após a primeira contratação, a Pizzolatti Engenharia e Consultoria alterou seu contrato social para Urbe Engenharia e Consultoria Ltda. Segundo Tramontin, todos as licitações foram homologadas pelos ex-prefeitos condenados sem considerar que a Constituição Federal expressamente proíbe qualquer parlamentar de firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público (art. 54, I, "a", da CF). Pizzolatti é Deputado Federal desde 1995.

O Promotor de Justiça observou ainda o fato de não se verificar, em nenhum momento da contratação, tanto na abertura do processo como na celebração do contrato, qual a efetiva tarefa que estava sendo contratada, condição que inviabilizou por completo a aferição da execução, porque não ficou claro o que efetivamente a empresa faria para a municipalidade. "Apesar de ter 'trabalhado' para o Município por quase quatro anos, não se pode precisar o que efetivamente foi feito pela empresa Pizzolatti/Urbe, através do preposto Ariel Pizzolatti", questionou Tramontin. "Sequer as pessoas que trabalhavam no Município sabem precisar exatamente o que Ariel fazia quando estava na Prefeitura".

Na ação, o Promotor de Justiça concluiu não haver dúvida quanto às seguintes irregularidades: a) não havia previsão das tarefas a serem realizadas: b) a execução não era por empreitada porque isso era impossível diante da inexistência de objeto determinado; c) não havia uma previsão do quantitativo de horas a serem executadas pela empresa; d) não havia qualquer tipo de fiscalização ou controle dos trabalhos eventualmente exercidos; e) os pagamentos eram feitos de acordo com os interesses da empresa e o número de horas cobrado era unilateralmente fixado por esta.

Não bastasse todas as irregularidades, descobriu-se finalmente a ocorrência de superfaturamento, na medida em que a própria empresa apresentou na sexta e última licitação o preço de R$ 50,00 por hora, quando na primeira contratação oferecera R$ 60,00. "Pode não parecer muito, mas a redução do preço foi no patamar de 20%. Numa conclusão simples, se agora o preço foi 1/5 menor do que nas anteriores, não há qualquer dúvida de que aconteceu o superfaturamento em relação aos preços anteriormente praticados pela mesma empresa", acusou Tramontin.

ACP n. 050.01.001049-1

Trecho final da sentença proferida na Comarca de Pomerode:

[...]
ANTE O EXPOSTO,
com supedâneo na Lei n. 8.866/93; com espeque no artigo 10, caput e incisos VIII e XII, c/c artigos 11, caput, 12, incisos II e III, e 21, inciso I, todos da Lei n. 8.429/92; com fulcro no artigo 37 da Constituição Federal de 1988, nos princípios constitucionais basilares da Administração Pública e em todas as provas elencadas nos presentes autos, JULGO PROCEDENTE os pedidos formulados através desta Ação Civil Pública n. 050.01.001049-1, ajuizada pelo MInistério Público em relação aos demandados para, em conseqüência:

A) Declarar NULOS os pertinentes processos licitatórios (n. 019/97, 001/98, 023/98, 017/99, 002/00 e 002/01) o contrato deles resultantes firmados entre o MUNICÍPIO DE POMERODE e a empresa URBE ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., anteriormente denominada PIZZOLATTI ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., por infração aos princípios constitucionais previstos no artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988;

B) Reconhecer o ato como de IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA previsto nos artigos 9°, caput, 10, incisos V, VIII e XII, e 11, caput, todos da Lei n. 8.429/92, os atos dos requeridos, esmiuçados no presnte decisum e decorrentes das licitações supra referidas;

C) Entendendo possível a cumulação dos pedidos formulados pelo ilustre representante do Parquet na exordial da presente ação civil pública, JULGAR PROCEDENTE a demanda em relação:

I - ao requerido HENRIQUE DREWS FILHO para condená-lo às cominações previstas no artigo 12, II e III, da Lei n. 8.429/92, assim discriminadas:

a) ressarcimento integral e solidário do dano equivalente à totalidade dos valores pagos pelo Município à empresa PIZZOLATTI/URBE ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., relativos às licitações n. 019/97, 001/98, 023/98, 017/99 e 002/00, acrescidos de juros e correção monetária a partir dos pagamentos efetuados, isto porque conforme regra insculpida no artigo 942 do Código Civil vigente (correspondente ao artigo 1.518 do Código Civil de 1916), todos aqueles que contribuem para a prática do ato ilícito devem responder solidariamente pela reparação do dano;
b) perda da função pública que deve ser-lhe imposta neste decisum porque entre a prolação da sentença e o seu trânsito em julgado pode ocorrer a assunção, por parte do réu, de alguma função ou cargo público, visto que preconiza o artigo 20 daquela lei que "a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória". Urge, então, aplicar ao réu a sanção de perda de função ou cargo público, para cargo ou função assumida entre a data da publicação da sentença e a data do seu trânsito em julgado;
c) suspensão, por força do inciso II do artigo 12 da Lei n. 8.429/92, dos direitos políticos do requerido HENRIQUE DREWS FILHO pelo prazo de oito (08) anos (cinco com relação ao artigo 10 e, três, ao artigo 11, ambos da Lei mencionada);
d) pagamento de duas multas civis, sendo que a primeira - pertinente ao artigo 10 - fixo em duas (02) vezes o valor do dano causado, corrigido monetariamente e, a segunda - com referência ao artigo 11 -, em cinco (05) vezes o valor da remuneração líquida percebida pelo agente como Prefeito Municipal;
e) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de oito (08) anos (cinco com relação ao artigo 10 e, três, ao artigo 11 da Lei referida).

II - ao requerido JOÃO ALBERTO PIZZOLATTI JUNIOR para condená-lo às cominações previstas no artigo 12, II, da Lei n. 8.429/92, assim discriminadas:

a) ressarcimento integral e solidário do dano equivalente à totalidade dos valores que lhe foram pagos pelo Município, através de sua empresa PIZZOLATTI / URBE ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., concernentes às seis licitações examinadas, acrescidos de juros e correção monetária a partir dos pagamentos efetuados;
b) perda da função pública (incisos II e III do artigo 12 da Lei n. 8.429/92);
c) suspensão dos direitos políticos do demandado JOÃO ALBERTO PIZZOLATTI JUNIOR pelo prazo nove (09) anos (cinco e meio com relação ao artigo 10 e, três e meio, ao artigo 11, ambos da Lei mencionada) (inciso II do artigo 12 da Lei n. 8.429/92);
d) pagamento de duas multas civis, sendo que a primeira - pertinente ao artigo 10 - fixo em duas (02) vezes o valor do dano causado, corrigido monetariamente e, a segunda - com referência ao artigo 11 -, em dez (10) vezes o valor da remuneração líquida percebida pelo agente como Deputado Federal;
e) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de oito (08) anos (cinco com relação ao artigo 10 e, três, ao artigo 11 da Lei n. 8.429/92).

III - ao requerido ARIEL ARNO PIZZOLATTI para condená-lo às cominações do artigo 12, II, da Lei n. 8.429/92, assim discriminadas:

a) ressarcimento integral e solidário do dano equivalente à totalidade dos valores que lhe foram pagos pelo Município, através de sua empresa PIZZOLATTI / URBE ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., concernentes às seis licitações examinadas, acrescidos de juros e correção monetária a partir dos pagamentos efetuados;
b) suspensão dos direitos políticos do requerido ARIEL ARNO PIZZOLATTI pelo prazo nove (09) anos (cinco e meio com relação ao artigo 10 e, três e meio, ao artigo 11, ambos da Lei mencionada) (inciso II do artigo 12 da Lei n. 8.429/92);
c) pagamento de uma multa civil - relativa ao artigo 10 - que fixo em duas (02) vezes o valor do dano causado, corrigido monetariamente;
d) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de oito (08) anos (cinco com relação ao artigo 10 e, três, ao artigo 11 da Lei n. 8.429/92).

IV - à empresa requerida URBE ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., antes denominada PIZZOLATTI ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., para condená-la às cominações previstas no artigo 12, II, da Lei n. 8.429/92 assim discriminadas:

a) ressarcimento integral e solidário do dano equivalente à totalidade dos valores que foram pagos pelo Município a seus proprietários, ARIEL ARNO PIZZOLATTI e JOÃO ALBERTO PIZZOLATTI JUNIOR, referentes às seis licitações examinadas, acrescidos de juros e correção monetária a partir dos pagamentos efetuados;
b) pagamento de uma multa civil - pertinente ao artigo 10 da Lei n. 8.429/92 - que arbitro em duas (02) vezes o valor recebido da Municipalidade, corrigido monetariamente;
c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária pelo prazo de cinco (05) anos (artigo 10 da Lei n. 8.429/92).

V - ao requerido REIMUND VIEBRANTZ para condená-lo às cominações previstas no artigo 12, II, da Lei n. 8.429/92, assim discriminadas:
a) ressarcimento integral e solidário do dano equivalente à totalidade dos valores pagos pelo Município à empresa PIZZOLATTI / URBE ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., relativos às licitações n. 019/97, 001/98, 023/98, 017/99 e 002/00, acrescidos de juros e correção monetária a partir dos pagamentos efetuados;
b) perda de função ou cargo público (incisos II e III do artigo 12 da Lei n. 8.429/92), assumido entre a data da publicação da sentença e a data do seu trânsito em julgado;
c) suspensão dos direitos políticos do demandado REIMUND VIEBRANTZ pelo prazo oito (08) anos (cinco com relação ao artigo 10 e, três, ao artigo 11, ambos da Lei mencionada) (inciso II do artigo 12 da Lei n. 8.429/92);
d) pagamento de duas multas civis, sendo que a primeira - pertinente ao artigo 10 - fixo em uma (01) vez o valor do dano causado, corrigido monetariamente e, a segunda - com referência ao artigo 11 -, em uma (01) vez o valor da remuneração líquida percebida pelo agente como Prefeito Municipal;
e) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de oito (08) anos (cinco com relação ao artigo 10 e, três, ao artigo 11 da Lei n. 8.429/92).

VI - à demandada MAGRIT KRUEGER para condená-la às cominações previstas no artigo 12, II, da Lei n. 8.429/92, assim discriminadas:

a) ressarcimento integral e solidário do dano equivalente à totalidade dos valores pagos pelo Município à empresa PIZZOLATTI / URBE ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA., relativos à licitação n. 002/01, acrescidos de juros e correção monetária a partir dos pagamentos efetuados;
b) perda de função ou cargo público (incisos II e III do artigo 12 da Lei n. 8.429/92), inclusive se assumido entre a data da publicação da sentença e a data do seu trânsito em julgado;
c) pagamento de duas multas civis, sendo que a primeira - pertinente ao artigo 10 - fixo em uma (01) vez o valor do dano causado, corrigido monetariamente e, a segunda - com referência ao artigo 11 -, em uma (01) vez o valor da remuneração líquida percebida pelo agente como Prefeita Municipal;
d) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário pelo prazo de oito (08) anos (cinco com relação ao artigo 10 e, três, ao artigo 11 da Lei n. 8.429/92).

VII - Cada devedor solidário será, assim, obrigado pela dívida toda para com o credor comum (Município de Pomerode - C), conforme prevê o artigo 275 do atual Código Civil (correspondente ao artigo 904 do Código Civil de 1916). Isto porque não se pode olvidar que alguns dos devedores podem não possuir bens passíveis de constrição suficientes a saldar a dívida referente a sua quota-parte, enquanto outros podem possuir bens em quantidade suficiente para saldar a sua dívida e a do devedor solidário na situação mencionada.

VIII - Condenar os demandados HENRIQUE, URBE ENGENHARIA, JOÃO ALBERTO PIZZOLATTI JUNIOR e ARIEL ARNO PIZZOLATTI ao recolhimento das custas e despesas processuais, na ordem de 22% pra cada um.

IX - Condenar o demandado REIMUND ao recolhimento das custas e despesas processuais, na ordem de 8% e a requerida MAGRIT no percentual de 4%.

Por fim, " tendo em vista que a propositura da ação civil pública constitui função institucionalizada, uma das razões porque dispensa patrocínio por advogado, não cabe o ônus do pagamento de honorários" (JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO. Ação Civil Pública. Freitas Bastos, 1995. p. 368).

Certifique o Sr. Escrivão acerca da fl. 1.305 dos autos, haja vista não constarem nesta oportunidade.

Transitada em julgado, e após observadas as formalidades legais, arquivem-se, com as cautelas de estilo.

P. R. I.
Pomerode (SC), 07 de julho de 2005.

Iraci Satomi Kuraoka Schiocchet
Juíza de Direito

Fonte: 
Coordenadoria de Comunicação Social