18.11.2019

Acusação do MPSC dá sequência ao julgamento da Operação Fundo do Poço

Em julgamento retomado no TJSC, 37 réus respondem por crimes de corrupção, advocacia administrativa, peculato organização criminosa e fraudes à licitação. A decisão deve ocorrer no próximo dia 29/11.
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O julgamento da Operação Fundo do Poço foi retomado em sessão extraordinária do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) com a sustentação oral do Ministério Público e, em seguida, dos advogados de defesa dos 37 réus que respondem por crimes resultantes de uma investigação do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (GAECO) de 2013. O Subprocurador-Geral para Assuntos Jurídicos do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), Fábio de Souza Trajano, sustentou, com documentos, escutas telefônicas e fotografias, que Romildo Titon, um dos acusados, desempenhava um destacado papel na obtenção e facilitação da liberação de recursos públicos.

A denúncia do Ministério Público foi por crimes relacionados à perfuração de poços artesianos em diversos municípios de Santa Catarina e do Paraná. De acordo com o MPSC, Titon agia para que as empresas Água Azul e Hidroani, lideradas respectivamente por Luciano Dal Pizzol e Miguel Roani, fossem contratadas para a execução das obras. Em contrapartida, os representantes das empresas repassariam quantias em dinheiro ao réu.

"São inúmeras as ligações telefônicas interceptadas que demonstram claramente a intervenção direta de Titon em relação à perfuração de poços artesianos, sua participação na obtenção de recursos e a indicação das famílias beneficiadas", argumenta Trajano. Além disso, ligações telefônicas, somadas a registros fotográficos, reforçam a tese da contrapartida, que é o recebimento da propina por parte do parlamentar. Conforme documentado nos autos, em três oportunidades, Titon teria recebido valores em dinheiro, além da promessa de perfuração de um poço profundo em sua propriedade".

Atuação das organizações criminosas

Em quase duas horas de sustentação oral, o Subprocurador-Geral para Assuntos Jurídicos mostrou a "engenhosidade" do esquema. Os grupos liderados por Dal Pizzol e Roani apresentavam diversos traços que caracterizam uma organização criminosa, tais como divisão de tarefas, estrutura definida de tomada de decisões e prática de infrações graves com o propósito de obtenção de ganhos financeiros ilícitos.

Na organização de Dal Pizzol havia, ainda, uma forte cultura de ocultação das atividades criminosas. Eram utilizados códigos nas conversas telefônicas, aliados ao uso simultâneo de diversos ramais telefônicos e à constante troca de aparelhos e chips .

Para garantir o perfeito desenvolvimento dos negócios, Romildo Titon tinha como papel coordenar as atividades de empresas que deveriam disputar o mercado. Para isso, o MPSC sustenta que o acusado dividia o mercado entre as empresas Água Azul e Hidroani evitando qualquer tipo de competição. Diversos documentos em computadores apreendidos indicavam a contabilidade paralela entre as duas empresas.

Os recursos públicos eram liberados aos municípios de duas formas: mediante convênios, quando havia a necessidade de licitação - e esta era feita de forma que a empresa vinculada ao esquema possuísse o menor valor -, e quando os recursos eram destinados diretamente a associações de agricultores, por meio de subvenções sociais.

Tal fato foi reconhecido pelo então prefeito de Ouro, Neri Luiz Miqueloto. Em interrogatório no curso da investigação, ele falou da facilidade e rapidez para conseguir verba parlamentar com o Deputado Romildo Titon. A obtenção dos recursos públicos, com o decisivo auxílio de Titon, era condicionada à posterior contratação da empresa por ele indicada.

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Corrupção X Doações eleitorais

As 733 páginas de um conteúdo farto em provas de promessas de solicitação e aceitação de vantagens ilícitas, tanto de Dal Pizzol quanto de Roani, levaram Romildo Titon a sugerir que os valores representavam apenas "doações eleitorais" e que nem mesmo teria recebido tais valores.

A tese, no entanto, foi refutada pelo MPSC, que destaca que o conjunto de provas não deixa dúvidas sobre o recebimento dos valores ilícitos das duas empresas. Ficou evidente, também, a entrega de vantagem ilícita como contrapartida pela atuação do agente público, e o posterior emprego dos recursos por parte de Titon não invalida o crime de corrupção, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).

Interferência na FATMA

Por volta do mês de novembro de 2013, Romildo Titon, valendo-se do cargo de deputado estadual, passou a fazer negociações com a Fundação do Meio Ambiente (FATMA) no intuito de alterar as normativas do órgão a fim de colaborar com os interesse das empresas de perfuração de poços artesianos, especialmente daquelas atuantes nas organizações criminosas das quais ele mesmo era integrante. Como contrapartida, Titon teria solicitado a Dal Pizzol a perfuração de um poço artesiano, avaliado em cerca de R$ 275 mil, em um imóvel de sua propriedade.

O MPSC destaca que há diversas provas de reuniões mantidas entre Dal Pizzol e outros representantes das empresas de perfuração de poços e o Deputado Titon - reuniões que foram, inclusive, admitidas pelo parlamentar durante interrogatório. Além disso, documentos juntados aos autos comprovam que o pedido de licença ambiental para a perfuração de um poço no imóvel de Titon é imediatamente posterior à promessa de intervenção em favor das empresas do setor, deixando clara a contraprestação ao parlamentar. O fato só não ocorreu efetivamente pela deflagração da fase ostensiva da Operação Fundo do Poço.

Possível ocultação de provas

Em 28 de novembro de 2013, dia em que a operação policial foi deflagrada para o cumprimento dos mandados de prisão e de busca e apreensão, o parlamentar Titon deixou em evidência a intenção de ocultar provas. Em uma conversa com a secretária do escritório regional de Campos Novos, obtida por escuta telefônica, o acusado pede, por meio de códigos, que sejam escondidas quantias em dinheiro.

Decisão deve sair até o final do mês

"Temos muita convicção de que vamos nesse caso combater a impunidade, punir estes crimes mais do que provados. Foram 18 meses de investigações, de obtenção de provas que não são fáceis. Mesmo os acusados sabendo que estavam sendo monitorados, confiavam que o braço do Estado não chegaria até eles. Chegou", finaliza o representante do MP catarinense.

Durante o dia, houve, ainda, a defesa dos réus no processo, entre eles agentes públicos e empresários. O caso começou a ser julgado em 6 de novembro, mas foi suspenso. Os 25 membros do Órgão Especial votam depois das sustentações orais. Ao todo, no processo, foram ouvidos os 37 réus, 30 testemunhas de acusação e 284 testemunhas de defesa. A decisão deve ocorrer no próximo dia 29/11.




Fonte: 
Coordenadoria de Comunicação Social do MPSC.